Francisco vs José

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Estréio hoje nesta rica e fascinante seara da blogosfera atendendo ao irrecusável convite do editor chefe deste blog e meu amigo Hiel Levy. Penso estar iniciando um caminhar diferente onde a troca de ideias, os posicionamentos e sobretudo os comentários avaliativos propunham-se edificantes e enriquecedores e, a partir deles, lancemos luzes sobre os mais variados temas permitindo assim, que este espaço pelo menos atice nossas curiosidades e quem sabe nos desloque da nossa habitual zona de conforto.
Bem que essa estréia poderia iniciar falando sobre saúde pública (área onde milito há 32 anos), aliás nem tanto saúde e nem tanto pública, tendo em vista que 1/3 do orçamento da SUSAM engorda os cofres de entidades privadas travestidas de Ong’s, OSCIP’s ou cooperativas algumas de duvidosa necessidade.
Bem mas isso é tema obrigatório para outras colunas oportunamente.
Abusando da fertilidade mental do leitor falaremos de duas personalidades cujas atitudes e decisões  têm tudo a ver com a minha e com a sua vida posto que ambos exercem autoridade a partir dos cargos que ocupam.
O primeiro personagem é um ser humano superlativo que está  além de seu tempo e cuja propriedade da fala e dos posicionamentos sobre os mais variados temas, encontram o eco necessário em diversas correntes do pensamento contemporâneo. Ele assumiu o pastoreio central da Igreja Católica, pertence a uma congregação, a da Companhia de Jesus ou Jesuítas, fundada por Santo Inácio de Loyola, de cujo seio surgiram os maiores pensadores, teólogos e doutores da Igreja nos seus mais de cinco séculos de existência.
Fazendo jus portanto a esta inigualável herança intelectual, o Papa Francisco acaba de editar uma encíclica ou ofício circular (aquilo que deve alcançar todos os recantos a que se destina) denominado Laudato si'(louvado sejas) cuja temática central não poderia ter sido outra e melhor escolhida, pois fala sobre a natureza e o meio ambiente numa alusão e homenagem ao cântico Louvado sejas meu Senhor, composto e entoado inúmeras vezes por São Francisco de Assis, santo protetor e padroeiro da ecologia.
E aí eu me pergunto- Ronaldo, vais ter coragem de analisar uma encíclica?
Ora meus amigos eu nem me atreveria a discorrer por sombrios e escorregadios caminhos,  posto que seria vergonhoso cabotinismo da minha parte tratar de tão específico e profundo tema porém, como criatura de Deus e vivente em um planeta para o qual desejo que meus netos e bisnetos e as mais longínquas gerações usufruam de forma mais respeitosa e proveitosa,   inevitavelmente sinto-me na obrigação de traçar um paralelo entre o escrito papal e a criminosa situação à qual está submetida a população de pelo menos 45 municípios do nosso estado vítimas que são dos previsíveis e inevitáveis processos naturais da cheia, porém, igualmente vítimas maiores da incúria do poder público.
Pois é nesse ponto leitores que entra o segundo personagem do texto, o José, menino pobre cuja família fugiu da cheia e da miséria do interior para encontrar vida melhor na cidade e se dar bem.
José, que durante a campanha eleitoral, usou e abusou  de imagens e personagens teatrais para transmitir a imagem de vida severina.
José que em nome desta vida pobre e sofrida, arvorou-se profundo conhecedor e porque não dizer (e isto é verdadeiro) militante das causas interioranas posto que o carreirismo político construído em dezenas de anos o “compeliu a esta espinhosa missão”.
E o que faz o José agora para evitar o êxodo de famílias pobres e sofridas como a sua ou para mitigar os efeitos deletérios da natureza se suas experiências de vida e política são mais que suficientes?
Respondo-Mais do mesmo!
O que temos assistido até agora é a mais terrível tragédia das cheias, mesmo a despeito de não estarmos vivenciando a maior enchente, fatos que a imprensa local e nacional teimam em mostrar apenas por ângulos vistos da capital e, com certa timidez, de alguns municípios apenas.
Diz  Francisco na sua encíclica  -“2.Esta irmã (terra) clama contra o mal que lhe provocamos por causa do uso irresponsável e do abuso dos bens que Deus nela colocou. Crescemos a pensar que éramos seus proprietários e dominadores, autorizados a saqueá-la. A violência, que está no coração humano ferido pelo pecado, vislumbra-se nos sintomas de doença que notamos no solo, na água, no ar e nos seres vivos. Por isso, entre os pobres mais abandonados e maltratados, conta-se a nossa terra oprimida e devastada, que «geme e sofre as dores do parto» (Rm 8, 22). Esquecemo-nos de que nós mesmos somos terra (cf. Gn 2, 7). O nosso corpo é constituído pelos elementos do planeta; o seu ar permite-nos respirar, e a sua água vivifica-nos e restaura-nos.”
E o José, diante desse flagelo provocado pela enchente dos nossos rios apenas promove uma ação governamental paliativa focada no assistencialismo e que conta com o beneplácito de políticos e  prefeitos dessas cidades, incluindo a capital, em atitudes meramente contemplativas sem análises abalizadas que permitam preparar essas cidades e populações a enfrentarem de forma mais organizada as futuras e inevitáveis enchentes.
Homem da beira dos rios e dos seringais, José bem que poderia melhor aproveitar sua experiência de vida e como mais alta autoridade estadual, promover e desenvolver as políticas públicas necessárias para pôr fim a essa tragédia cíclica ao menos nos seus efeitos mais perversos que causam perdas e danos às populações ribeirinhas, socorrendo-se dos estudos e análises propostos por institutos de pesquisa locais e nacionais e por estudiosos do solo e do clima amazônico.
E isto não custa caro!
Ensina Francisco:”111. A cultura ecológica não se pode reduzir a uma série de respostas urgentes e parciais para os problemas que vão surgindo à volta da degradação ambiental, do esgotamento das reservas naturais e da poluição. Deveria ser um olhar diferente, um pensamento, uma política, um programa educativo, um estilo de vida e uma espiritualidade que oponham resistência ao avanço do paradigma tecnocrático. Caso contrário, até as melhores iniciativas ecologistas podem acabar bloqueadas na mesma lógica globalizada. Buscar apenas um remédio técnico para cada problema ambiental que aparece, é isolar coisas que, na realidade, estão interligadas e esconder os problemas verdadeiros e mais profundos do sistema mundial.”
Bem se vê que nossos dois personagens guardam apenas uma remota similaridade, a de assinarem nomes de origem humilde. Nos demais parâmetros, ambos se distanciam quer na nobreza dos gestos quer na grandeza das atitudes que cada um tem em relação aos mais humildes filhos de Deus.
Que a encíclica papal confronte, povo e poder, com suas consciências e obrigações, que cuidemos mais do meio ambiente e que governos e governantes aprendam mais e melhor a preparar a mãe terra pras gerações futuras. Té logo!

Ronaldo Derzy Amazonas

Ronaldo Amazonas, ex-diretor da Fundação Alfredo da Matta, um dos mais polêmicos ativistas da internet. Escreve sobre o que lhe vier à cabeça, sempre com uma pegada forte e opiniões muito próprias.

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