País dos palpiteiros

Por Carlos Santiago*

Os palpiteiros e seus palpites tomaram conta do Brasil e do mundo. Palpite não vem do conhecimento científico, aferido e estudado. É tão somente um conhecimento intuitivo, um pressentimento, uma suspeita, uma sugestão de um intrometido sobre qualquer tema: dos estudos da Nasa aos resultados dos jogos de botões. Por isso, o palpite é tão popular podendo ser encontrado fartamente numa roda de bar, numa reunião de torcedores, numa festinha de crianças, numa paquera sem compromissos, nas mídias sociais e nos grandes empreendimentos de comunicação.

Somente uma tese baseada no palpite pode determinar o impossível, como a quantidade de grãos de areia no planeta terra; o número exato de estrelas no universo; a quantidade de litros de água dos oceanos e o número de formigas existentes no globo terrestre; o início correto da vida humana na terra; o momento certo em que um time de futebol do Amazonas vai chegar na primeira divisão do campeonato brasileiro; e o ano em que o América do Rio de Janeiro vai ser campeão mundial.

O período mais fértil para os palpites e para os palpiteiros é o início de cada ano. Já disseram o que acontecerá no Brasil e nas eleições municipais da capital do Amazonas, em 2020: dois ex-presidentes vão morrer; o crescimento econômico será de 2,30%; terremotos irão atingir a cidade de São Paulo; Manaus elegerá um prefeito apoiado por Bolsonaro.

Existem ainda palpiteiros de assuntos internacionais. Recentemente, bastou os meios de comunicação noticiar a guerra de palavras entre os presidentes do Brasil e da França por causa das crescentes queimadas nas áreas da Amazônia, para surgir palpites de todos os lados, do homem simples aos mais ricos, passando por jornalistas e cientistas, tanto os favoráveis ao presidente brasileiro quanto os defensores do governante francês. O mesmo ocorreu após o resultado das últimas eleições na Argentina, um prato cheio para os palpiteiros, defensores do bolsonarismo e do kirchnerismo sobre o futuro do País portenho.

Os palpites no Brasil são prestigiados e os palpiteiros mais famosos ganham espaços nos jornais e cargos públicos relevantes. É só ligar um canal de esporte e você encontra nobres palpiteiros discorrendo sobre todos os tipos de esportes. O atual governador do Amazonas, grande palpiteiro de televisão, foi eleito chefe de governo pelos seus palpites. Na telinha, ele dava palpite sobre tudo que acontecia na vida do amazonense, de uma investigação policial até a melhor forma de investimento na saúde e na educação. Um outro palpiteiro famoso é o presidente Jair Bolsonaro. Entre suas pérolas estão os seguintes palpites: a guerra entre os EUA e Irã será o fim da humanidade; as péssimas condições da educação brasileira atual é culpa do educador Paulo Freire.

O palpite ou o ato de palpitar é cultural, envolvem pessoas de todas as classes, de credos e de cores. O problema existe quando um governante, um administrador público, um estadista ou um líder político agem com bases em palpites, pressentimentos e intuições. As decisões de governos ou pronunciamentos públicos precisam de dados aferidos, experiências exitosas, modelos científicos comprovados, pois o interesse e o bem-estar de uma sociedade deve estar acima dos palpites e dos palpiteiros.

*O autor é sociólogo, analista político e advogado