O meu tempo

Não, não vou escrever sobre a ideia de tempo absoluto ou de relativo, de estático ou a consequência de um movimento, um fenômeno cíclico ou um reflexo do pensar. O meu tempo é só meu, assim como as minhas experiências e sonhos. Sinto que estou num tempo existencial de muito estranhamento.
Pois bem. Ligo a televisão e não encontro mais pessoas e personagens queridas. Rostos de atores, de atrizes e de apresentadores, como o de Tarcísio Meira, de Carlos Zara, de Eva Todor, Marília Pêra, Chacrinha e Bolinha, não estão na tela apresentando programas ou atuando nas novelas. Isso me causa estranheza!

Procuro algo espetacular. Jogos dos campeonatos de futebol. Sem Zico, sem Roberto Dinamite, ausência de Maradona, de Bebeto e de Romário, tudo muito desconhecido nos campos de futebol, pouco talento jogando e atuações sem emoções. Isso me causa estranheza!

No rádio, não ouço mais belas canções. Músicas de Belchior, de Guilherme Arantes, de Marina, de Zé Ramalho, de Lionel Richie, dos Paralamas do Sucesso, de Rita Lee, de Elton John e de Elis Regina não estão na programação. Isso também me causa estranheza!

Procuro política decente. Um ponto de orgulho na vida pública. Ulisses Guimarães, Jefferson Peres, Mário Covas, Roberto Campos, Leonel Brizola, Miguel Arraes, Marco Maciel e Pedro Simon, mas não encontro. A política virou um balcão de negócio financeiro. Causa-me estranheza!

Na vizinhança, não tenho mais uma saudação de “um bom dia”. O bom papo descontraído na calçada acabou. Crianças do bairro já não brincam de bola nem levantam pipas, preferem quartos fechados e celular nas mãos. Causa-me estranheza!

As moças seguem bem distantes de mim. Tornei-me um ser invisível. As mulheres de tranças nos cabelos e com vestidos nas canelas, não as vejo mais. As únicas jovens que ainda falam comigo, por meio de celular, sempre estão oferecendo seguro de vida, plano funeral e crédito consignado. Ah! Como isso me causa estranheza.

Com o passar do tempo, acordo com dificuldades de abrir uma das mãos. É difícil equilibrar o doce e o sal no corpo. Caminhadas são impostas e cansativas. As veias das pernas doem, a massa muscular está indo embora, a memória vem falhando e o número de medicamentos só cresce.

O passado anda flutuando na minha mente, o futuro não faz sentido, o presente é uma experiência de instantes. Deixou o tempo levar a minha vida como ele quer.

Quando menino ansiava pelo tempo dos adolescentes, quando adolescente sonhava com o tempo dos adultos, hoje só clamo pelo tempo do menino descalço, sem medo, amoroso e com uma imensa vontade de construir novos tempos.

Assim seguimos, cada ser humano carrega um tempo que é só seu, mesmo que o mundo esteja tão curto e que a influência exterior tenha tanto impacto, o tempo não é linear nem único para todos.

Com 55 anos de idade, distante da mocidade e próximo da velhice, sinto muito estranheza, viver esse tempo que é só meu, com perplexidade, com medo e cheio de limitações.

*Sociólogo, Analista Político e Advogado.