Mesa ou balcão de negócios?

A maioria dos meus poucos porém, fiéis leitores semanais nesse espaço, sabem que vivi antes como servidor público e vivo até hoje como aposentado após ter passado mais se quatro décadas atuando no serviço público estadual e municipal.

Meus colegas de trabalho sabem melhor ainda, que fui um inquieto e insatisfeito servidor público quando o assunto era salário e o bem estar no serviço.Sinto imenso orgulho da minha trajetória e das lutas e embates que travei na área da saúde pública. Nunca abri mão dessa condição até quando atuei como gestor no estado e no município. Como filiado ao sindicato da minha categoria profissional dos farmacêuticos, fiz parte da mesa de negociação do SUS tanto no âmbito estadual quanto municipal.

Para quem não sabe, os trabalhadores da saúde nos três níveis de governo, são a única categoria de servidores públicos a terem incrustada numa lei federal (no caso a Lei do SUS) um mecanismo de tratativas e decisões para questões salariais e bem estar na proteção dos seus interesses. Inteligentemente, o legislador criou as Mesas de Negociação federal, estadual e municipal e estas, devem ser compostas e funcionarem de modo proporcional,dividindo suas composições paritariamente entre trabalhadores, gestores e entidades que atuam no âmbito da proteção e defesa do setor e dos trabalhadores dessa área.

Pois bem, desafortunadamente e para tristeza dos servidores públicos estaduais e municipais, o que vimos atualmente observando no âmbito das Mesas Estadual e Municipal de Negociação do SUS, mais se parece com um balcão de negócios.

Lembro bem, que entre 2014 e 2018 quando eu militava nos movimentos sindicais e representava a minha categoria profissional nessas duas mesas, tinha presidente de sindicato que fora cooptado pelo sistema e possuía cargo de confiança no governo e, não somente votava contra os trabalhadores, como barganhava favores e se alinhava aos gestores, agindo de modo contrário aos interesses dos seus representados. Um descalabro!

As reposições, os reajustes, os aumentos salariais, a segurança e o bem estar no trabalho, as progressões e promoções funcionais e até a justa aplicação dos Planos de Cargos e Carreiras, podem e devem ser debatidas e decididas no âmbito dessas mesas de negociação.

Ocorre, que do lado dos servidores da saúde, há um mal desnecessário em que seus trabalhadores estão fragmentados portanto fragilizados, ao se dividirem em dezenas de sindicatos e associações.

Disso se aproveitam alguns dirigentes dessas entidades sindicais encastelados há décadas na gestão das mesmas, os quais aprenderam mais a fazer negócios com governos e governantes do que defenderem os interesses dos seus filiados.

Habilidosa e matreiramente, os governantes e os gestores da saúde, sabendo dessa debilidade moral e dessa fragilidade de caráter desses sindicalistas, oferecem mundos e fundos a estes que passam a atuar como pelegos, omitindo-se em defender, no âmbito das mesas, os interesses das suas categorias.

O governo do estado vem há quatro anos prorrogando e descumprindo a aplicação do Plano de Cargos e Carreiras, postergando as progressões e promoções e devendo o pagamento das datas base. Tudo isso sob o olhar contemplativo do Ministério Público e da Justiça que, mesmo não sendo provocados, são sabedores dessa realidade cruel e insana.

Centenas de servidores públicos da saúde aposentam-se todos os meses levando para seus contra cheques um baita prejuízo mensal para o resto da vida, simplesmente porque completam o tempo de serviço e vão para casa sem a devida migração funcional e consequentemente com as perdas salariais. Mais grave ainda, é que quem deveria pautar e cobrar isso na Mesa de Negociação estadual, se alia vergonhosamente ao governo e ao gestor da saúde numa abjeta troca de favores.

Outro dia assisti um patético vídeo em que uma moça, eterna presidente de um sindicado de nível médio da saúde e outro dirigente sindical de nível superior ambos com assento na Mesa, de modo subalterno e subserviente, posam com o governador elogiando uma figura que tem tudo a ver com o descumprimento do Plano de Cargos e que tem dificultado o pagamento das perdas salariais dos trabalhadores da saúde.

Mas a explicação para esse rompimento com a Lei, embora simples e objetiva, em nada permite ao estado deixar de honrar com a norma estabelecida.

É que o estado está quebrado financeiramente por obra e graça do governador que gastou demais e endividou o estado para se reeleger.

E o que o trabalhador da saúde tem a ver com isso?

Tudo e nada ao mesmo tempo! E explico.

Têm tudo a ver, porque não conseguem enxergar essa realidade e cobrar desses dirigentes sindicais uma postura de caráter e de respeito ou destroná-los das cadeiras e botarem lá pessoas mais preparadas ou que assumam de fato e de direito a defesa das categorias representadas.

Nada a ver, porquanto, apenas esperam pacientemente que o mecanismo criado por lei federal para atuar na defesa dos seus interesses ou que obrigue os gestores no cumprimento de lei dos Planos de Cargos, sejam devida e rigorosamente cumpridos.

Outro fator lamentável, é que governo do estado tem atuado na Mesa de Negociação como um rolo compressor emparedando por meio de mecanismos e manobras até escusas, a maioria dos dirigentes sindicais.

O governo do estado pegou a fraqueza de alguns desses dirigentes e os trata mais como aliados, pedintes e subservientes o que desequilibra a paridade e enfraquece a luta por melhorias salariais.

A Mesa de Negociação do SUS estadual mais parece um balcão de negócios onde o governo e o gestor da saúde fazem que pagam o que devem e os dirigentes sindicais fingem que cobram ou mistificam que estão lá para defenderem as pautas dos trabalhadores. Uma lástima!

Tá mais que na hora(e já estamos nos preparando para tal) de os servidores da saúde do estado retomarem e reavivarem o MOTS-Movimento Organizado dos Trabalhadores da Saúde, como ferramenta fundamental e necessária, para romper com essa irresponsável inércia e mancomunagem sindical e associativa.

Já está ficando tarde demais chamar às falas os dirigentes sindicais com assento na Mesa e partir para o confronto como forma de inverter essa lógica perversa para que os membros da Mesa de Negociação do SUS estadual representantes(?) dos trabalhadores tomem vergonha na cara e pressionem o gestor estadual e o governador a respeitarem a lei do PCCS.

O governo deve ser compelido a pagar as datas base atrasadas e a atual e promover as progressões e promoções devidas aos servidores por bem ou por mal. E isso é inegociável!

Com altivez, sentemos pois, os trabalhadores da saúde à Mesa, e saiamos detrás desse balcão de negócios em que tristemente estão postados muitos falsos e desonestos sindicalistas pretensamente defensores das suas categorias.

Té logo!