A Câmara Municipal de Manaus (CMM) realiza coletiva de imprensa, nesta sexta-feira (14 de março), para anunciar a decisão de anular o concurso público da Casa Legislativa, após nova recomendação do Ministério Público do Amazonas (MPAM). Serão anulados os três editais do certame realizado em setembro de 2024 (Editais nº 001/2024/CMM, nº 002/2024/CMM e nº 003/2024/CMM). A decisão foi tomada ontem, com apoio de 23 dos 24 vereadores que se reuniram com os promotores. O Instituto Acesso, que organizou o concurso, divulgou nota de repúdio contestando a decisão e prevendo uma avalanche de ações judiciais decorrentes da anulação, além de cravar que, a partir de agora, a insegurança jurídica está instalada.
O concurso público da Câmara Municipal de Manaus (CMM), cujas provas para técnicos e analistas foram aplicadas no dia 17 de novembro de 2024, tornou-se centro de uma contestação política e judicial. Desde o início do processo, os candidatos aprovados relatam uma sucessão de dificuldades e tentativas frustradas de dialogar com a nova gestão da Câmara para garantir a homologação do certame.
O concurso foi realizado durante a gestão do então presidente Caio André (UB), que não conseguiu se reeleger. Nos bastidores da Câmara, já havia previsões de que seu sucessor, David Reis (Avante), não homologaria o concurso. Ainda assim, a Comissão dos Aprovados buscou acreditar na institucionalidade do processo e tentou, sem sucesso, obter uma audiência com o gabinete da Presidência e a Diretoria Geral da CMM.
Em meio a essas dificuldades, surgiu uma reviravolta: todas as notícias de fato relacionadas ao concurso que tramitavam na 57ª Promotoria do Ministério Público (MP) foram transferidas para a 60ª Promotoria, o que levantou suspeitas. Ao investigar o ocorrido, a Comissão dos Aprovados descobriu que uma denúncia foi apresentada ao MP alegando possível favorecimento a familiares do procurador da Câmara, Sílvio Costa. A suposta irregularidade envolvia sua filha e seu genro, ambos aprovados no certame.
Diante disso, a Comissão pleiteou ao Ministério Público que fosse feita uma recomendação diferenciada, permitindo a homologação dos cargos de nível médio (Edital 01) e superior (Edital 02), com exceção dos cargos de médico e procurador (Edital 03), que deveriam ser investigados separadamente. O pedido foi acolhido pelo promotor Armando Gurgel, resultando no Despacho nº 0111/2025/57PRODHC, que recomendou:
Ontem, após reunião com os 24 vereadores, foi sugerido por 23 parlamentares a publicação de uma nova recomendação, agora englobando todo o certame, o que foi acatado pelo MPAM. A publicação está no Diário Oficial do MPAM desta quinta-feira (13/03).
Nesta sexta (14), a Mesa Diretora da CMM, conforme informou o vereador-presidente Davi Reis (Avante), deverá anunciar a decisão tomada pela maioria, considerando os problemas ocasionados pela banca examinadora.
Entre as falhas apontadas na nova Recomendação nº 0003/2025, emitida pela 57ª Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania (Prodihc), destacam-se:
- Violação dos malotes de provas, comprometendo a segurança do certame;
- Adoção de critérios subjetivos na correção das provas, como o arredondamento de notas sem previsão no edital;
- Falta de previsão de cotas raciais nos editais, contrariando normas de combate à discriminação racial;
- Contratação irregular da banca organizadora, o Instituto Acesso, sem a devida publicação do Termo Contratual no Portal Nacional de Contratações Públicas, conforme exige a Lei nº 14.133/2021;
- Existência de mais de 50 denúncias e processos judiciais em curso, indicando um alto nível de contestações e litígios sobre a condução do concurso.
Além disso, o MP apontou suspeita de favorecimento no cargo de procurador legislativo, pois o candidato aprovado tem parentesco com o procurador legislativo da CMM, envolvido na organização do certame.
Medidas recomendadas
O MPAM determinou a anulação total dos editais e estabeleceu diretrizes para a realização de novos concursos, incluindo a organização de um novo certame, a garantia de cotas raciais e para pessoas com deficiência (PCDs) e a contratação de uma nova banca organizadora.
A nomeação da nova comissão e a escolha da instituição realizadora devem ocorrer em, no máximo, 90 dias, com a publicação do novo edital até 15 de setembro de 2025.
A decisão foi consolidada em reunião na sede do MPAM, nesta quinta, com a presença da procuradora-geral de Justiça em exercício, a subprocuradora de Justiça para Assuntos Jurídicos e Institucionais, Anabel Vitória Mendonça de Souza; do presidente da CMM, vereador David Reis (Avante); da procuradora de Justiça Delisa Vieiralves, coordenadora do Centro de Apoio Operacional de Proteção e Defesa dos Direitos Constitucionais do Cidadão, dos Direitos do Consumidor e da Defesa do Patrimônio Público (CAO-PDC); do promotor de Justiça Mirtil Fernandes do Vale; do procurador-geral da CMM, Iuri Albuquerque Gonçalves; e de 24 vereadores.
O promotor Armando Gurgel Maia ressaltou que a anulação do concurso é essencial para garantir a integridade dos processos seletivos da CMM e para preservar a confiança pública nas instituições.
O outro lado
O Instituto Acesso, que organizou o concurso, divulgou uma nota de repúdio, rebatendo ponto a ponto as acusações do MPAM e prevendo uma avalanche de ações judiciais. Veja:
“O Instituto Acesso repudia veementemente a recomendação do Ministério Público do Estado do Amazonas para a anulação do concurso da Câmara Municipal de Manaus, que surpreende pela falta de embasamento e por ignorar os esclarecimentos já prestados, perante a Câmara Municipal de Manaus.
Mais grave ainda é o fato de que o Ministério Público sequer ouviu o Instituto Acesso antes de emitir tal recomendação, desconsiderando todas as provas que comprovam a lisura do certame.
A alegação de que houve correção por meio de inteligência artificial das provas discursivas para o cargo de procurador, bem como o suposto vazamento dos nomes dos candidatos, é um absurdo completo! As correções foram realizadas por um magistrado, com total independência e imparcialidade, fato que foi simplesmente ignorado pelo parquet.
Além disso, as supostas irregularidades já haviam sido esclarecidas e alguns procedimentos até mesmo arquivados. No entanto, sem qualquer justificativa razoável, essas questões foram ressuscitadas após a mudança de promotor, em um verdadeiro atentado à segurança jurídica e aos princípios da razoabilidade e da ampla defesa.
Outro ponto que não pode ser ignorado é que as questões relativas aos candidatos com deficiência (PCD) foram devidamente atendidas, seguindo à risca as determinações do edital e da legislação vigente. Não há qualquer fundamento para questionamentos nesse aspecto, e insistir nisso apenas reforça o caráter infundado da recomendação.
Da mesma forma, a acusação de que houve favorecimento de parentes de servidores da Câmara é completamente descabida.
O concurso foi conduzido com absoluta imparcialidade, sem qualquer tipo de interferência ou favorecimento. Todos os candidatos concorreram em igualdade de condições, conforme as regras estabelecidas no edital. Qualquer tentativa de distorcer esse fato é uma afronta à transparência e à seriedade do processo seletivo.
Além disso, a sindicância realizada pela Câmara Municipal para apurar eventuais irregularidades no cargo de auditor revelou o óbvio: não houve vazamento de informações ou qualquer prejuízo aos candidatos. Mesmo diante dessa conclusão, ocorrida há pelo menos, dois meses, ainda não houve uma decisão definitiva sobre o caso, o que apenas prolonga a incerteza e a insegurança jurídica para todos os envolvidos.
Sobre as recentes alegações divulgadas, esclarecemos:
Violação dos malotes de provas: como já dito, a sindicância da Câmara já havia apontado que não houve qualquer vazamento ou violação dos malotes, reafirmando a segurança do certame.
Critérios subjetivos na correção das provas: Todas as correções foram realizadas com base nos critérios estabelecidos no edital.
Falta de cotas raciais: O edital do concurso seguiu a legislação vigente à época de sua publicação, respeitando todas as normas aplicáveis ao certame. Além disso, não há nenhuma legislação no estado do Amazonas que contemple cotas para concursos públicos. A recomendação do Ministério Público, se fosse nesse sentido, deveria buscar a adequação normativa em vez de penalizar um certame conduzido dentro das regras estabelecidas. Caso haja interesse na implementação de cotas raciais nos concursos municipais, a medida adequada seria a atuação dos vereadores para legislar nesse sentido, garantindo segurança jurídica e previsibilidade para futuros certames.
Contratação do Instituto Acesso: O processo de contratação da banca organizadora ocorreu dentro da legalidade, e eventuais questionamentos sobre a publicação do termo contratual não interferem na lisura do concurso, nem é motivo para anulação, apenas é um pretexto insipiente.
Denúncias e processos judiciais: A existência de ações judiciais não comprova qualquer irregularidade, sendo comum que concursos públicos enfrentem contestações, tanto é verdade que o último concurso realizado pela Câmara foi concluído 20 anos depois justamente em face de uma ação judicial. Até o momento, nenhuma decisão judicial reconheceu qualquer ilegalidade que justificasse a anulação do certame.
O Instituto Acesso não aceitará essa tentativa de invalidar um concurso legítimo e tomará todas as medidas cabíveis para garantir que a verdade prevaleça. Se necessário, adotaremos medidas extremas para assegurar que os direitos dos candidatos sejam preservados e que a legalidade do certame seja respeitada.
Ressalte-se que, há necessidade de se fazer algumas indagações: Quem ganha com a anulação do concurso? Essa é uma reflexão necessária. A quem interessa a instabilidade e a insegurança jurídica? Quem se beneficia com a incerteza e o desrespeito ao esforço dos candidatos adotando essa medida extrema?
Além disso, se a recomendação do Ministério Público se baseia na transparência e lisura, porque alguns candidatos que lograram êxito no certame foram impedidos de participar da reunião ocorrida no dia 13/03/2025, entre o parquet e os vereadores?
É fundamental que essas questões sejam analisadas com responsabilidade, garantindo que a lisura do certame seja preservada e não com açodamento que a Recomendação do Parquet prega.
Por fim, registre-se ainda que, a medida extrema intentada pelo parquet, acarretará sérios danos ao erário, vez que certamente haverá uma enxurrada de ações buscando indenizações e, pergunta-se, quem pagará esta conta?
Do Rio de Janeiro para Manaus, 14 de março de 2025
Instituto Acesso“
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