Novíssimos

Conta-se uma história em que um sheik árabe riquíssimo passeando à noite pelos belos jardins do seu suntuoso palácio notou que, correndo esgoelado, vinha ao seu encontro um dos seus servos. -O que se passa contigo? perguntou o sheik.

-A morte veio ao meu encontro e me ameaçou e me amedrontou; quero que meu senhor me empreste o mais veloz e intrépido puro sangue da sua criação para que eu fuja da morte indo me refugiar em Teerã.
Não entendendo muito a situação e muito menos a saída porém, penalizado com o pavor do seu empregado, o patrão concordou e emprestou seu mais veloz cavalo ao indigitado servo que partiu em disparada galopando rumo a Teerã.
Retornando para seu aposento, no caminho, o poderoso sheik se depara com a morte e a admoesta. -Porque amedrontaste e ameaçaste meu empregado? No que a morte retrucou: – Não amedrontei tampouco ameacei seu servo apenas marquei um encontro com ele esta noite e não deu nem tempo de avisá-lo que esse encontro será em Teerã.
Ouvi essa história ao participar de um curso sobre Escatologia proferido por um padre, aliás uma bela e prodigiosa formação, que versou sobre esse mistério insondável, incompreensível e inexpugnável que nos alcançará a todos mais cedo ou mais tarde e para a qual devemos nos preparar.
A morte, na doutrina católica, faz parte dos cinco últimos acontecimentos que nos afetarão a todos após o fim da nossa peregrinação terrena juntamente com o juízo, o purgatório, o inferno e o paraíso, também denominados de Novíssimos, um termo bíblico que está escrito no livro do Eclesiástico: Em todas as tuas obras, lembra-te dos teus novíssimos, e jamais pecarás”. (Eclo 7,40).
Poucas criaturas humanas foram ou estiveram preparadas para esse inevitável encontro com o fim da vida terrestre.
Nós, os cristãos que nascemos marcados pelo signo da salvação em Cristo Jesus, sabemos que esta é representada pela promessa de que se vivermos a fé, os ensinamentos, os mandamentos, os sacramentos, a caridade e a esperança, haveremos de triunfar sobre a morte e, a vida eterna, será então o prêmio merecido para aqueles que vivem e acreditam nessa promessa.
Não nascemos para morrer; nós moremos para viver! Entretanto, há um longo e sinuoso caminho que nos conduz à vida eterna mas, para alcançarmos esse fim, haveremos de traçar uma trajetória e travar uma terrível batalha contra tudo aquilo que nos afasta dos planos da salvação e que estão representados todos os dias nos prazeres da vida, na negação das coisas do Alto, no nosso distanciamento daquilo que edifica a alma e agrada a Deus, na inobservância dos mandamentos, na falta do exercício da caridade, na ausência de amor ao próximo, entre outras desvirtues que nos afastam dos planos de Deus para suas criaturas mais caras.
Em sua grandiosa obra literária, Santo Afonso Maria de Ligório supera as expectativas da sua sabedoria no livro denominado: Preparação para a Morte-Considerações sobre as verdades eternas, onde nos propõe uma grande e detida reflexão sobre o ocaso das nossas vidas exortando-nos a nos prepararmos para uma boa morte.
Entre as diversas citações bíblicas e dos Santos sobre o tema, extraio algumas as quais devem nos levar a introspecções e introjeções de modo a apreendermos que não se está nessa vida apenas de um jeito passageiro ou vazio, mas sim, de maneira sobrenatural que nos deve conduzir à eternidade:
“A vida presente não nos foi dada para repousar, mas para trabalhar, e, por meio destes trabalhos, merecer a vida eterna”.(Santo Ambrósio em Serm. 45).
“Bem aventurados os mortos que morrem no Senhor. Desde hoje que descansem de seus trabalhos”.(Ap 14.13).
Santo Agostinho disse “Aquele que não abandona o pecado antes que o pecado abandone a ele, dificilmente poderá, na hora da morte, detestá-lo como é devido, pois tudo o que fizer nessa emergência, o fará obrigadamente.“
“É para o pecador justo castigo o esquecer-se de si próprio na morte, depois de ter esquecido a Deus durante a vida”.(Santo Agostinho).
São Paulo conhecia perfeitamente a verdade sobre a eternidade a ponto de dizer:”Viver é Cristo e morrer é lucro”.(Fl 1,21).
“Cem mil pecadores que teimam viver no pecado até a morte, apenas um só se salvará no momento supremo”.(São Jerônimo).
São Vicente Ferrer afirmava que: “A salvação de um desses pecadores seria um milagre maior que a ressurreição de um morto”. “Louvado sejas, ó meu Senhor, por nossa irmã a Morte corporal, à qual nenhum homem vivente pode escapar”(São Francisco de Assis)
O triunfo sobre a morte foi uma primazia de Deus apenas para seu Filho entretanto, o Criador, prometeu e reservou ao seu lado uma morada para cada um dos seus eleitos e, só depende de cada um de nós se quisermos experimentar essa dádiva eternamente, buscarmos trilhar o caminho da fé, da esperança e da caridade, as denominadas Virtudes Teologais, as quais nos conduzirão rumo ao encontro com o Pai e para isso, a morte é apenas o começo. Eu creio! E você?
Té logo!