A marcha dos povos indígenas

Por José Ricardo Weddling*

Os direitos dos povos indígenas continuam ameaçados. Medidas do Governo Federal pretendem desmontar as instituições de amparo a esses povos. Mas estão resistindo.

Na Câmara dos Deputados, foi lançada semana passada a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas, composta por deputados federais e senadores. Mais de 200 parlamentares subscreveram. Mas quantos irão participar de verdade? Quantos têm compromisso com a causa indígena? A Frente estará sendo coordenada pela deputada federal Joênia Wapichana (Rede/RR), a única indígena parlamentar no Congresso Nacional. Estão também na coordenação o deputado federal José Ricardo Wendling (PT/AM) e o senador Randolfe Rodrigues (Rede/AP).

E a Frente terá muito trabalho. O Governo Federal, na Medida Provisória 870, transfere a Fundação Nacional do Índio (Funai), do Ministério da Justiça para o Ministério da Mulher, Família e dos Direitos Humanos. Porém, as atribuições de reconhecimento e demarcação de terras indígenas foram repassadas para o Ministério da Agricultura, dominada pelos latifundiários e ruralistas. A Funai fica assim esvaziada em suas funções.

Ora, não é de agora que os grandes interesses empresariais colidem com os interesses dos indígenas. Invasões e exploração ilegal de madeira, de mineração em suas terras são focos de constantes denúncias. A expansão do agronegócio também atinge os povos indígenas. Conflitos com morte não foram a exceção nos últimos anos.

Além disso, a extinção da SECADI e da Coordenação Geral da Educação Escolar Indígenas do MEC foi motivo de repúdio de todas as lideranças indígenas e educacionais do país. Uma conquista histórica simplesmente sendo eliminada.

E ainda tem a intenção da municipalização da saúde indígena, que o Governo Federal propôs, por ora suspenso. Mas tem oposição dos próprios indígenas e dos prefeitos, que já enfrentam dificuldades de manter médicos nas áreas urbanas. As estruturas da Secretaria Especial de Saúde Indígena e os Distritos Sanitários de Saúde Indígena nos Estados tiveram redução de recursos e a perda dos médicos cubanos. Muitas comunidades estão sem assistência do poder público.

No Amazonas, estado que tem a maior quantidade de povos indígenas do Brasil, no IV Encontro do Fórum de Educação Escolar Indígena do Amazonas (FOREEIA), em dezembro de 2018, foi criada a Frente Amazônica de Mobilização de Defesa dos Direitos Indígenas (FAMDDI), que reúne entidades indígenas e não indígenas voluntárias. Foi uma iniciativa importante. Envolver as inúmeras instituições e movimentos que lutam pela causa em ações conjuntas.

Daí resultou na realização do Seminário Direitos Humanos na Amazônia, indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, ocorrido final de março/2019, na Escola Normal Superior – UEA. Ali, dentre os diversos manifestantes, destaca-se a fala do professor Gersen Baniwa, que denuncia a violação dos direitos humanos dos povos indígenas e tradicionais no Estado do Amazonas.

Mas é preciso destacar duas mobilizações significativas na primeira semana de abril/2019, com o IV Encontro de Lideranças Indígenas e a III Marcha dos Povos Indígenas do Amazonas. Centenas de lideranças indígenas representando dezenas de etnias de vários municípios do Amazonas questionavam as recentes medidas do Governo Federal, as violações constantes nas terras indígenas e os enfrentamentos necessários.

Mas o que chamou mais atenção foi a Marcha dos Povos Indígenas, com o tema “Resiliência e luta pela (R)Existência e Vida Plena”. Cobraram na porta do Ministério Público Estadual ações de políticas públicas para seus povos e, em seguida, marcharam, mesmo debaixo de chuva, para o Palácio do Governo, onde uma comitiva dialogou com o vice governador.

Na educação a pauta é grande. Escolas indígenas, formação de agentes de saúde, merenda regionalizada, currículos que garantam o estudo da língua indígena, concurso público específico, dentre outros.

Os indígenas pleiteiam a criação de um Fundo de Apoio a Projetos para ações sustentáveis, Plano Estadual dos Territórios Etnoeducacionais, Criação do Conselho Indígena do Amazonas, e que a Fundação Estadual dos Indígenas (FEI) esteja ligada à Secretaria do Meio Ambiente.

Não sei se o Governo Estadual vai atender os pleitos entregues. Mas recursos têm. Foi aprovado no final do ano de 2018 emenda à Constituição de minha autoria, que prevê que 0,5% da receita líquida do Estado seja investido em política indígena. No orçamento de 2019, há previsão de R$ 65 milhões. Precisam saber o que vão fazer com esses recursos.

A marcha dos indígenas pelos direitos vai ser longa e com muitas pedras pelo caminho. Vão precisar de muita unidade e coragem.

*O autor é economista e deputado federal pelo PT