Operador do guindaste que virou provocando morte de trabalhador no Largo estava afastado pelo INSS e não poderia ser contratado para o serviço, diz advogada

A recente queda da estrutura de Natal no Largo de São Sebastião, em Manaus que deixou um morto e expôs uma série de falhas de segurança levantou uma discussão urgente: o operador do guindaste estava afastado pelo INSS, recebia auxílio-doença e, ainda assim, foi contratado para trabalhar na montagem. Diante do caso, a advogada previdenciária Laurri Sarubbi esclarece o que a lei realmente permite (e proíbe) durante o período de afastamento.

Segundo Laurri, o auxílio-doença é um benefício voltado para o segurado temporariamente incapaz para o trabalho. Ou seja: se a pessoa está recebendo o benefício, ela não pode exercer atividade profissional que exija esforço compatível com aquilo que motivou o afastamento. Trabalhar normalmente enquanto está “incapaz” pode gerar sérios problemas.

“O ponto central é simples: se o INSS reconheceu a incapacidade, o segurado não pode assumir atividades que contrariem essa condição. Isso pode levar à suspensão do benefício e até à obrigação de devolver valores recebidos”, explica a advogada.

Ela reforça que algumas situações até são permitidas como realizar tarefas leves, participar de cursos ou exercer atividades que não gerem renda e não estejam relacionadas à incapacidade mas tudo depende do caso.

“O que não pode é trabalhar de forma remunerada em algo que exija exatamente a capacidade que o INSS declarou como comprometida. No acidente do Largo, se confirmado que o operador estava recebendo auxílio-doença e exercendo função incompatível, isso vira um problema previdenciário sério”, completa Laurri.

A advogada destaca ainda que muitos segurados não entendem totalmente as regras do benefício e acabam se colocando em risco jurídico. “Quando o segurado aceita um serviço enquanto está afastado, ele não só pode perder o auxílio, mas também pode responder por fraude, dependendo do caso”, afirma.

Laurri aproveita o caso para reforçar a importância de orientação especializada: “Cada situação precisa de análise técnica. Antes de aceitar qualquer trabalho enquanto está afastado, o ideal é consultar um advogado previdenciário para evitar prejuízos e até complicações legais.”

Fatores técnicos

A engenheira de Segurança do Trabalho Lizandra Bentes, especialista em Segurança, Meio Ambiente e Saúde (SMS) e com mais de duas décadas de atuação em operações de risco, apresentou uma análise técnica sobre fatores que costumam levar ao tombamento de guindastes em montagens de grandes estruturas, como a árvore de Natal instalada no Largo de São Sebastião, onde ocorreu o acidente.

“Os acidentes com guindastes geralmente envolvem múltiplas variáveis que precisam ser avaliadas antes da execução da operação. Sobrecarga, cálculo incorreto da massa e do centro de gravidade da carga, raio de içamento maior que o previsto, extensão inadequada da lança e falhas nos estabilizadores são alguns dos fatores mais comuns”, explica Lizandra. Ela acrescenta ainda que condições do solo, rajadas de vento, rigging inadequado e erros humanos relacionados à comunicação ou qualificação da equipe também são determinantes.

Ao comentar especificamente sobre o acidente no Largo, a engenheira ressalta: “Sem laudos técnicos é impossível afirmar a causa com 100% de certeza, mas observações plausíveis incluem ausência de levantamento geotécnico, falta de uso de placas de distribuição de carga sob os estabilizadores, escolha de guindaste com capacidade insuficiente, execução sem plano de içamento detalhado e procedimentos de montagem mal definidos. O solo é crítico: qualquer afundamento diferencial compromete a estabilidade da máquina”.

Sobre a importância do planejamento e da documentação, Lizandra destaca: “Operações desse porte exigem plano de içamento, plano de rigging, ART, análise de risco, certificação dos equipamentos e registro da qualificação da equipe. Checklists pré-operação, supervisão técnica presencial, monitoramento de vento e delimitação de áreas de exclusão também são essenciais para reduzir riscos”.

Questionada sobre erros ou negligências operacionais mais prováveis, ela aponta: “Falta de checklists, estabilizadores sem sapatas adequadas, equipe não treinada, ausência de responsável técnico, comunicação insuficiente, desrespeito à tabela de carga do fabricante e operação em condições climáticas inadequadas são fatores que costumam contribuir para acidentes”.

Lizandra também recomenda tecnologias e procedimentos modernos para aumentar a segurança: “Indicadores de momento de carga (LMI), sensores de pressão no solo, anemômetros com corte automático, câmeras de visão remota, drones e simulações digitais ajudam a reduzir incertezas e apoiar decisões técnicas durante a operação”.

Ela reforça a mensagem central para empresas e gestores de eventos: “Segurança não é custo, é condição essencial. Cada pessoa na cadeia, gestor, engenheiro, operador, rigger, sinalizador, tem papel decisivo. Responsabilidade compartilhada, comunicação clara e respeito às interrupções por risco salvam vidas e protegem patrimônio”.

Sobre Lizandra Bentes

Com vasta experiência em engenharia de segurança, gestão de riscos e auditorias técnicas, Lizandra Bentes atua na elaboração de procedimentos e treinamentos para operações críticas em diversos segmentos. Mais informações sobre seu trabalho podem ser acompanhadas em @lizandra.bentes.

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