Por Dauro Braga*
Há pouco tempo tive ciência de que era portador de uma grave doença. Pela segunda vez um terrível mal tomou de assalto meu corpo e quer medir forças com Deus na definição do meu tempo sobre a terra. Volto a me tratar e a confiar na perícia dos médicos que me atendem e na eficácia das drogas que me ministram, porém, cada vez mais ciente de que a minha cura depende d’Aquele que construiu essa fantástica máquina que é o meu corpo físico. Minha fé me fortalece e me dá a certeza de que toda a medicina do mundo sem a potencialização da ação divina em nada resulta. A última palavra é de Deus e deve ser aceita com humildade e respeito.
Ao sermos confrontados com situações de risco como a que estou vivenciando é natural que reflitamos sobre o que fizemos da vida que nos foi dada. Algumas vezes percebo que meus pensamentos soltam as amarras e fazem uma viagem introspectiva por vários momentos da minha existência como a querer recordar-me das minhasrealizações e fracassos, vitórias e derrotas. “ Ego sum qui sum”. Sou hoje o resultado de tudo o que vivi.
Neste movimento para dentro de mim mesmo imagino as diversas fases da minha vida como um imenso arquivo com gavetas em que guardei velhos papéis registrando a minha história, e todos elas acabam sendo sintetizadas em um extrato de conta corrente onde se encontram lançados à crédito as minhas boas ações e a débito todos os atos que cometi e que ferem princípios não recomendáveis ao bom comportamento humano e cristão. Esse balanço faço eu na terra com os valores que tenho e faz Deus no céu à luz da sua infinita bondade.
Quero que “quando eu me tornar saudade” fique aqui o registro do que vivi, como sendo o meu legado às gerações futuras. Sem querer ser pretensioso penso que talvez isso ajude outros mais jovens que eu, talvez meus acertos e meus erros sirvam de lição e suavizem o seu caminho pela vida afora.
Iniciando a abertura das gavetas onde se encontram os registros da minha história de vida, percebo que essas estão organizadas por fases da minha existência, nelas fui encontrando fatos relacionados com a minha infância, adolescência e maturidade. Muita coisa em cada uma delas, muitas lembranças de pessoas a quem amei e amo até hoje e que já desembarcaram do trem da vida. Essa realidade cruel me revela com a real intensidade da saudade o quanto essas perdas são dolorosas pelo vazio profundo que deixaram em minha existência. Meus pais, minha filha Patrícia que nos deixou tão precocemente, minha Babá, amigos e parentes.
Esse trem chamado vida, onde também sou passageiro, vem se tornando cada vez mais vazio deixando em mim a sensação de abandono e solidão. Inevitável afirmar que, o encontro da minha saudade com as recordações fizeram aflorar as minhas emoções, fazendo com que um rio de lágrimas rompesse o dique que as continha e rolasse copiosamente pelo meu rosto.
É complicado lidar com a perda de pessoas amadas como as que tive de suportar pela vida afora. Paciência, “maktube”.Todos esses fatos traumatizantes e inevitáveis me serviram de lição, modificando alguns conceitos que eu tinha, mostrando-me a fragilidade de nossa vida terrena, o quanto sou pequeno diante da grandeza de DEUS e o quanto andei distante Dele em alguns momentos da minha existência. No final das contas do que acumulamos na terra só nos vale os amores que cultivamos.
E isso nos leva a pensar no amor, pois nem só de perdas e tristezas é feita a vida. A força e a beleza do amor é o motor que nos impulsiona, que faz com que a vida mereça ser vivida. De algo não tenho que me penitenciar diante Deus e de todos com quem convivi: todas as vezes que amei alguém nas diversas fazes da minha vida o fiz com toda a intensidade do meu coração. Continuarei a caminhar pela estrada da vida amando cada vez mais ao Cristo, a minha esposa a doce Ângela, meus filhos, netos, e a minha legião de parentes e amigos. Espero que todos eles saibam disso.
Gostaria que se aplicasse ao meu final o que diz Nelson Cavaquinho em sua mais bela canção “Quando eu morrer os meus amigos vão dizer que eu tinha um bom coração, alguns até hão de chorar e querer me homenagear…” mas sei também, como continua a canção, que “depois que o tempo passar, sei que ninguém vai se lembrar que eu fui embora, por isso é que eu penso assim, se alguém quiser fazer por mim que faça agora”.
*O autor é empresário (daurofbraga@hotmail.com)
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