Paciente morreu depois de fazer nebulização com hodroxicloroquina em hospital de Itacoatiara

Uma paciente de 71 anos morreu em fevereiro deste ano, no Hospital Regional José Mendes, no município de Itacoatiara (a 176 km de Manaus, em linha reta), após ser submetida a várias sessões de nebulização com hidroxicloroquina. Além disso, o novo prefeito, Mário Abrahim (PSC), demitiu médicos que considerava adversários políticos e contratou outros sem registro no Conselho Regional de Medicina ou estrangeiros que ainda não fizeram a prova de admissão para trabalhar no país, o Revalida.

Estes episódios levaram o deputado estadual Dermilson Chagas a pedir hoje ao Ministério Público do Estado do Amazonas e ao Ministério Público Federal que investiguem a fundo as denúncias. “Como todos já sabem, a hidroxicloroquina não é recomendada para tratamento de Covid-19, mas parece que o Hospital José Mendes ainda não recebeu essa informação. É importante as 100 mortes que ocorreram ali neste ano e descobrir se outras pessoas faleceram por fazer nebulização com hidroxicloroquina”, afirmou.

O medicamento hidroxicloroquina é utilizado no tratamento da artrite reumatoide, lúpus eritematoso, afeções dermatológicas e reumáticas e malária. O remédio não é recomendado para tratamento de pessoas com Covid-19 pela Organização Mundial de Saúde (OMS), Associação Médica Brasileira (AMB), Associação Brasileira de Enfermagem em Terapia Intensiva (Abenti), Associação Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT) e Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC).

O uso da hidroxicloroquina foi proibido em diversos países, após estudos científicos constatarem que, além de não ser adequado para o tratamento de Covid-19, a sua utilização acelerou o processo de inflamação e resultou na morte de pacientes.

Mortes em Manaus

A reportagem entrevistou vários profissionais de saúde, entre médicos, farmacêuticos e fisioterapeutas e todos condenaram a prescrição feita no Hospital Regional José Mendes, especialmente porque já há estudos comprovados que administração de hidroxicloroquina causa arritmia. Além disso, os profissionais informaram que já existe uma farta literatura especializada e científica no mundo inteiro que contraindica o uso de hidroxicloroquina para este fim.

“Na área de pesquisa de científica, nós costumamos dizer que a hidroxicloroquina para Covid-19 já está morta e enterrada. Inclusive, a Associação Médica Brasileira já entrou com uma representação contra o Ministério da Saúde pelo fato do Governo Federal ter enviado uma médica para Manaus que receitou nebulização com hidroxicloroquina para pacientes e que faleceram. Nós tivemos cinco casos somente em Manaus de pessoas mortas por causa dessa irresponsabilidade”, afirmou um dos médicos consultados.

Paciente de Itacoatiara respirou sal de cozinha

O denunciante informou que foi receitado à paciente duas vezes por dia a administração de nebulização com Clenil com 20 gotas de Atrovent e mais dois comprimidos de hidroxicloroquina macerados em soro fisiológico 0,9%, que é o mesmo que 0,9% de cloreto de sódio, o popular sal de cozinha.

O cloreto de sódio possui 40% de sódio em cada grama e sua principal função é equilibrar a quantidade de água no organismo, juntamente com o potássio, trabalhando em conjunto. O sódio retém os líquidos enquanto o potássio elimina. Dessa forma, as células ficam, supostamente, com a quantidade certa de água.

Soro fisiológico 0,9% significa que em cada 1ml de solução há 9mg de cloreto de sódio. Uma ampola de soro fisiológico 0,9% possui 10ml, portanto tem 90mg de sal, e, como foi administrado por duas vezes ao dia, a paciente recebeu 180mg por dia.

Os sites especializados em remédios alertam que a solução de cloreto de sódio 0,9% é contraindicada nos casos de hipernatremia (alta concentração de sódio no sangue), retenção de água e hipercloremia (alta concentração de cloro no sangue).

A administração da droga foi prescrita para ser feita duas vezes ao dia em “BiPap” – que é a pressão positiva em vias áreas a dois níveis, ou seja, um nível para inspiração (Ipap) e outro para expiração (Epap), o que acelerou, segundo o denunciante, o agravamento e posterior falecimento da paciente.

Procedimento experimental é defendido por Bolsonaro

Vários veículos de comunicação do Brasil publicaram matérias informando que o procedimento adotado pelos médicos do Governo Federal de prescrever nebulização com hidroxicloroquina é defendido pelo presidente da República, Jair Bolsonaro. Em reportagem publicada no último dia 17 de abril, o Nexo Jornal afirma que ao menos oito pessoas morreram no Brasil neste ano depois de serem tratadas com prescrição nebulizatória.

“Foram quatro casos no Rio Grande do Sul e cinco no Amazonas, todos de pessoas submetidas a procedimentos clandestinos”, diz um dos trechos da reportagem, que destaca que essa aplicação é experimental e não tem comprovação científica.

Veja a prescrição:

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