As Igrejas e a pandemia do novo coronavírus

Esta semana, a partir de 1º de junho, o Governo do Estado começou a flexibilizar as medidas de isolamento social e de combate à pandemia, com a autorização de funcionamento de alguns setores comerciais e também de igrejas, templos, lojas maçônicas e estabelecimentos similares.

Por meio do Decreto 42.061, de 16 de março de 2020, o governo afirmou a situação de emergência de saúde pública devido à disseminação do novo coronavírus (Covid-19). No dia 21 de março deste ano, o Decreto 42.099 suspendeu o funcionamento de estabelecimentos, de atividades e de eventos que promovem aglomerações, incluindo as igrejas, templos religiosos e estabelecimentos similares. Somente atividades consideradas como essenciais poderiam continuar funcionando, mas com cuidados de proteção individual e distanciamento entre as pessoas. Missas e cultos não foram considerados essenciais.

Assim, todas as igrejas suspenderam suas atividades. A Igreja Católica, por meio da Arquidiocese de Manaus, na pessoa do arcebispo Dom Leonardo Steiner, divulgou Orientações Pastorais suspendendo todas as reuniões, encontros formativos e missas para o público em todas as paróquias e comunidades a partir do dia 23 de março. E justificou que a decisão atendia às recomendações das autoridades em saúde do Estado do Amazonas para evitar a disseminação da Covid-19 e contribuir para o controle da circulação do vírus.

O arcebispo recomendou que as celebrações fossem realizadas de forma restrita, sem a presença de público, e transmitidas pelas redes sociais. Porém orientou que as famílias, ao permanecerem em isolamento social, pudessem manter a leitura da Palavra de Deus, as orações do terço e os encontros da Campanha da Fraternidade. Nesse ponto, a Igreja Católica teve uma nova experiência com a realização das cerimônias da Semana Santa, sem a Via-Sacra, sem a igreja cheia, sem a realização da Festa de Pentecostes, sem o grande evento no Sambódromo, além da não realização de procissões de padroeiros neste período.

A pandemia, ao obrigar as pessoas a ficarem em casa, também trouxe reflexões sobre a questão da espiritualidade e das práticas religiosas. Dom Leonardo, ao participar de um diálogo comigo por meio de live, disse que o momento é de esperança e de fé. Seria um momento para aprofundar a espiritualidade e o sentido da vida. Ele tem esperança que as pessoas saiam mais humanas e que se tornem pessoas melhores após a pandemia.

Padre Ricardo Castro, diretor do Instituto de Teologia Pastoral e Ensino Superior da Amazônia (ITEPES), disse que o povo tem necessidade de religião, de se reunir, de se congregar. Mas ele também lembra que a Igreja não é só o templo. Igreja somos todos nós. O templo está dentro de nós. Por isso, é importante a experiência interior desse momento de dificuldades. Ele lembra que os primeiros cristãos se reuniam nas casas, com as famílias.

Padre Ricardo também diz que essa espiritualidade é o momento de refletir sobre a morte e o sofrimento. É o momento de viver a fé num contexto de responsabilidade e de cidadania. Esta vivência em família, o isolamento social, deve contribuir para uma melhor compreensão da vida e da solidariedade.

Seremos uma Igreja igual, teremos uma nova espiritualidade após a pandemia? pergunta o padre. Para ele, a fé deve levar o cristão a fazer escolhas políticas que garantam a cidadania e as políticas públicas de saúde e de assistência à população, de geração de emprego e renda às famílias. Ele lembrou que até o ar que respiramos estará mais limpo, após a pandemia, o que nos leva a refletir sobre a situação ambiental em que vivemos.

Mas alguns setores da sociedade estavam com pressa para que as igrejas voltassem a funcionar. Na Assembleia Legislativa do Amazonas foi aprovado no dia 6 de maio, o projeto de autoria do deputado João Luiz (Republicanos), para que os templos fossem reabertos, como sendo atividade essencial. Ele é evangélico.

A justificativa para esse projeto foi que, devido ao confinamento com o isolamento social, as pessoas precisam de “alimento espiritual”.  Na oportunidade, o deputado Dr. Gomes (PSC), favorável à matéria, disse que “o Estado pode cuidar apenas do corpo físico, mas o lado psicológico e emocional, só a religião pode cuidar”. Já a líder do Governo, deputada Joana Darc (PL), considerou que existe uma “doença espiritual” e que só as igrejas podem resolver. Muitos setores da sociedade questionaram o projeto aprovado, pois a pandemia estava em ritmo de crescimento com 9.242 casos e 751 mortes.

Com o anúncio da liberação de parte do comércio no dia 1° de junho, e as igrejas estando fora, teve intensa pressão por parte de líderes evangélicos para incluir os templos nesse primeiro ciclo. O deputado federal Silas Câmara (Republicanos/AM), coordenador da bancada evangélica na Câmara dos Deputados, fez um vídeo manifestando indignação em defesa da abertura das igrejas. E conseguiu. O governador cedeu. Mesmo o Amazonas já tendo 41.774 casos e 2.071 mortes até o dia 1º de junho e no interior a pandemia não para de crescer.

A Igreja Católica não embarcou nessa. O arcebispo Dom Leonardo Steiner anunciou dia 23 de maio, que os templos católicos ficariam fechados por mais 30 dias, até dia 23 de junho. E disse ainda: “Com esse cuidado, a nossa Igreja contribuiu para a diminuição do índice da propagação do vírus”. E ele está certo. A defesa da vida em primeiro lugar.