As grandes perdas

Por Dauro Braga*

A lua que me encantava no passado já não me encanta mais, não vejo nela o mesmo brilho de outrora, e parece que até São Jorge desmontou de seu cavalo e resolveu mudar para outras paragens pois já não vejo mais a sua figura depois que o intruso homem pisou em seu solo sagrado. Essa inoportuna visita que revelou a cadeia de montanhas que nos dava a ilusão de vermos um homem  montado sobre um cavalo, acabou com o doce misticismo que envolvia aquela figura emblemática e tirou um pouco da beleza celestial que contemplamos ao longo de tantos séculos. A mesma lua que no passado fazia despertar grandes emoções nos corações dos homens, fonte de inspiração dos poetas sonhadores e dos trovadores românticos e chorões, hoje, no esplendor mais intenso da sua fase mais linda e apoteótica que é a lua cheia, já não desperta nos apaixonados o mesmo interesse do passado.

Será que a lua perdeu sua beleza, ou será que o homem, entristecido com o afastamento da mulher amada que deixou de vê-lo como o príncipe encantado de seus sonhos para enxerga-lo como o tormento de seus pesadelos, perdeu o interesse pela fonte de romantismo que a lua representava? Será que as lágrimas de saudade que a lua viu rolar nos rostos apaixonados pela ausência da mulher amada conseguiram afogar o verdadeiro amor? O que de  real aconteceu?

No passado os jovens se reuniam para as famosas luaradas que eram feitas em praias ou terreiros de casarões do sertão nordestino. Nessas ocasiões, os apaixonados se deixavam ficar a contemplar a lua, como dizia o poeta, “aquele lustre de cristal dos trovadores que pende lá no céu apainelado pelas mãos dos místicos pintores”, que tem o poder mágico de mostrar ao homem a monumental beleza da obra do Criador. Extasiados diante de tanta beleza lhes rendiam homenagens através de canções e poemas em perfeita sintonia com o amor e o esplendor da natureza. Tão deslumbrante é uma noite de lua cheia que o poeta Catulo da Paixão Cearense num momento de sublime inspiração legou as gerações futuras
uma das mais belas músicas do cancioneiro brasileiro, “Luar do sertão”.

Depois de uma reflexão profunda sobre tudo isso que perdemos, chego a conclusão de que iniciamos um novo ciclo de vida onde a perda é maestro que rege a grande orquestra de nosso destino. Ao longo desses dez últimos anos perdemos mais do que ganhamos, cabe-nos lembrar algumas perdas: Perdemos a copa de 2014 e sofremos a humilhante goleada de 7×1 da Alemanha. Perdemos o nosso maior orgulho da aviação civil com a decretação de
falência da VARIG em 20 de agosto de 2010. Perdemos 242 jovens numa das maiores tragédias como foi o incêndio da Boate Kiss em Santa Maria-RS. Perdemos 199 pessoas no maior acidente aéreo com o avião da TAM em S. Paulo e que vai completar 10 anos no próximo dia 17 do corrente. Perdemos grande parte do amor fraternal que sempre existiu no povo brasileiro, quando começaram a semear a discórdia entre branco e negro, patrão e
empregado, sulista/nortista e nordestino, homem e mulher. Fizeram crescer o sentimento divisionista que hoje paira ameaçador sobre a unidade territorial. Perdemos o respeito e a credibilidade que sempre tivemos perante todas as nações. Perdemos o referencial da nossa dívida externa que em 2008 era de 200 bilhões de dólares e que atualmente acendem a ¾ do PIB. O certo é que 40% de todos os impostos arrecadados são destinados ao pagamento somente dos juros da citada dívida. Perdemos mais de dois trilhões de reais pelo ralo da corrupção.

Perdemos recentemente o nosso Museu Nacional. Perdemos grandes empresários, escritores, artistas, e tantas outras personalidades que é impossível citá-las. Entre todas as perdas que tivemos, a meu ver, as mais significativas de todas foram a perda do civismo e da VERGONHA.

*O autor é empresário (daurofbraga@hotmail.com)