A visão de mais um manauara fanático da arquibancada, no maior acontecimento do ano na cidade

Por Hiel Levy

Cheguei ontem pela manhã de uma viagem longa, durante a qual fui tratar da saúde, e decidi acompanhar meu filho do coração e os amigos ao jogo do Manaus FC com o Caxias (RS), que decidiria se o futebol amazonense voltaria à Terceira Divisão do Campeonato Brasileiro (Série C) depois de 20 anos de tentativas frustradas, desde que o São Raimundo desceu a ladeira. O resultado todos já sabem – vitória por 3 x 0 e a garantia do tão sonhado acesso. Mas escolhi narrar em primeira pessoa o que vi e ouvi, de tão impactante que foi a experiência.

Na fase anterior, contra o São Raimundo paraense, acompanhei o resultado do segundo jogo por meio de mensagens atribuladas do Marquinhos, meu filho do coração. Ele já se dizia impressionado com o público que não lotou sequer o anel inferior da Arena da Amazônia. Ontem, percebemos que algo diferente estava acontecendo na chegada, quando nosso carro não conseguia chegar lá nem por caminhos alternativos. Descemos na avenida do Samba e seguimos a pé até o bar onde marcamos o encontro com os amigos.

Depois de enfrentar a fila na entrada, entramos, já a poucos minutos do início da partida. Já não havia lugar no anel inferior. Subimos mais alguns lances de escada, deixando um membro da trupe pelo caminho – ele não aguentou a subida e eu só aguentei porque o tratamento deu certo. Escolhemos mal o lugar – só descobrimos isso no final do primeiro tempo, quando o sol inclemente – sensação térmica de 50 graus à sombra – nos alcançou. Àquela altura já havíamos nos impressionado com os 44.121 manauaras fanáticos, que não pararam de chegar até a metade da partida, a ponto de fazer a alegria dos inúmeros cambistas, inclusive alguns que vendiam ingressos ganhos por entidades filantrópicas, como constatamos claramente. Gente com a camisa do Nacional, do Rio Negro, do São Raimundo, do Flamengo, Fluminense, Vasco, São Paulo, Corinthians, Palmeiras e até do Grêmio. Família inteiras. Muita criança. Uma festa!

O grito que mais ecoou representou bem a motivação para a lotação – “Gaúúúcho, viaaaaado”. Era a resposta às inúmeras provocações da gauchada nas redes sociais, depois do primeiro jogo. E os gestos de índio flechando se multiplicaram, no campo e fora dele. O indefectível “ÔÔÔÕÔ… biiiiichaaaa” a cada batida do goleiro deles na bola também era recorrente. Homofobia? Não, não creio, pelo menos neste caso. Era um desabafo. Foi assim que eu interpretei.

As ameaças à diminuta torcida gaúcha – cinquenta pessoas, no máximo – antes durante e depois da partida, foram a nota dissonante do espetáculo. Desnecessário. A Polícia Militar fez o papel dela e evitou qualquer exagero.

Ah, o jogo. Falemos do jogo.

Primeiro tempo tenso, muito tenso. Foi o Caxias que abriu o placar. O Manaus trocava passes, mas não conseguia penetrar. Aos 10 minutos, o primeiro susto.  O lateral Muriel, do Caxias, foi progredindo meio sem querer, a zaga abriu, ele penetrou pela direita, cruzou e Taiberson, de canela, tocou pro gol. Gol anulado por causa de um impedimento que, de onde eu estava, não pareceu existir. Mas o que vale é o que o árbitro decidiu. Ufa!

O Manaus chutou com perigo algumas vezes, sempre de fora da área. Marquinho, ao meu lado, dizia que os gaúchos cansariam e o segundo tempo seria mais fácil. Antes disso, entretanto, o lance que decidiria a partida preocupou a todos. Diogo Dolem recebeu cruzamento dentro da área, contou com desvio de Mateus Oliveira no primeiro pau e quase abriu o placar. Não fez o gol e acabou com uma lesão grave depois de ser acertado na cabeça por Eduardo Diniz. O jogador do Manaus caiu desacordado no gramado. Os colegas tiravam a camisa para abanar e a ambulância foi chamada. Todos tememos pelo pior, mas ele foi encaminhado ao Hospital 28 de Agosto e passa bem.

Vitinho, o baixinho da camisa 22 e chuteiras laranjadas, entrou e mudou o jogo. Antes dele virar protagonista, entretanto, tomamos mais alguns sustos, como o chute cruzado de Taiberson que explodiu no travessão. Mas o goleiro deles, o Lee, também salvou o balaço de Derlan que tinha endereço certo.

Quando o estádio já começava a silenciar devido à tensão, o técnico Wellington Fajardo tirou o bom lateral Negueba, que foi muito mal na partida de ontem, sem conseguir acertar um cruzamento sequer, e colocou o meia Evair. Deu uma de Fernando Diniz noso treinador. E deu certo.

Aos 26, Rossini explodiu a massa. Vitinho avançou pela direita e cruzou na pequena área. Mateus Oliveira matou no peito e rolou para trás, para chegada de Rossini. O camisa 10 mandou uma bomba com raiva, da risca da pequena área e a bola ainda bateu na trave antes de estufar as redes.

A esta altura eu tinha fugido do sol com o Marquinhos e dado a volta no campo para me acomodar em uma brecha que consegui na arquibancada, pertinho das cabines onde via os colegas comunicadores se esgoelando para narrar a partida, tão nervosos quanto nós.

Uns dez minutos depois Evair cobrou lateral da esquerda, a bola passou por todo mundo na área e parecia ter o destino da linha de fundo, mas Vitinho apareceu como uma flecha, aproveitando a hesitação da defesa e tocou para o meio da área, entre o goleiro e o zagueiro, encontro Rossini bem colocado para fazer o segundo. Seria o gol da classificação, mas teria mais.

Àquela altura a briga na arquibancada era para fazer o povo sentar. Mas quem se aguentava? Nem com banho de cerveja a turma se abaixava.

Aos 48, a gauchada foi toda para a área. Num lance confuso, reclamaram do toque de mão de um manauara dentro da nossa área. Vitinho, que não tem nada com isso, puxou o contra-ataque e deixou Mateus Oliveira na boa para driblar o sagueiro com um corte seco e matar o jogo colocando a bola no canto do goleiro, para desespero dos narradores gaúchos que, decepcionados, diziam que o Caxias tinha perdido pra torcida, pro Manaus e pro juiz catarinense Bráulio da Silva Machado, que foi cercado pelos jogadores gaúchos.

Não teve mais jogo, só festa do nosso lado e reclamação da gauchada. E a arquibancada soltou o grito de “e-l-i-m-i-n-a-d-o” repetidas vezes. Só deu pra perceber que o Mateus Oliveira foi expulso porque ele fez a festa da galera, imitando o índio repetidas vezes, até irritar os jogadores do Caxias. Na confusão, mais três foram mandados pro chuveiro, um nosso e dois deles.

Na saída, povo alegre e satisfeito nem reclamava do enorme estacionamento, possivelmente não previsto pelo Manaustrans. Não vi um único guardinha nas imediações. Trânsito caótico.

Manaus na série C, mas antes ainda com duas fases pela frente para tentar conquistar o título da Série D. Agora, animado e pé quente, vou estar lá de novo. E você?

P.S. – Por que não escrevi essa crônica ontem mesmo? O cansaço e os amigos não deixaram.

Olha aí o blogueiro na arquibancada, na foto do Reginaldo Naoli

Foto principal: Mario Oliveira

 

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Este post tem um comentário

  1. Andrei Filipe

    Parabéns ao Manaus,mas sou Rio Negro.E não consigo ir para o estádio torcer pra outro time Espero dias melhores pelo menos.

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