Decisão de fechar semi-aberto do Compaj gera conflito de instituições: MPE é contrário; Defensoria a favor

Enquanto o Ministério Público do Estado do Amazonas anunciou que vai recorrer da decisão judicial que determina a desativação do regime semiaberto no Complexo Penitenciário Antônio Jobim (Compaj), a Defensoria Pública do Estado se manifestou a favor da medida, o que indica claramente que a situação ainda vai render polêmica. A ideia é que os presos sejam monitorados por meio de tornozeleira eletrônica.

Acompanhado do Promotor de Justiça Jeferson Neves de Carvalho, Coordenador do CAO-CRIM, e da Promotora de Justiça Christianne Corrêa, titular da 24ª Promotoria de Justiça com atuação junto à Vara de Execuções Penais, o Procurador-Geral de Justiça Carlos Fábio Braga Monteiro expôs aos jornalistas os argumentos do MP-AM contra a medida. Em princípio, o PGJ argumentou que a decisão da Justiça é referente a um pedido da Secretaria de Administração Penitenciária (Seap) feito no início do ano passado, no auge da crise no sistema prisional do Estado. Na ocasião, o Ministério Público do Estado pediu diligências à Justiça com o intuito de que a Seap informasse e desse garantias de que seria feita análise do processo de cada detento, suficiência de tornozeleiras, a certeza de que a Secretaria teria como monitorar os apenados e onde colocá-los em caso de revogação, pedido que foi aceito pelo Juiz, mas as diligências nunca foram cumpridas.

“Fomos surpreendidos com essa decisão que fere a Constituição no que diz respeito à lei de execução penal, ao princípio da individualização da pena. Não se pode pensar, em uma canetada só, você tratar situações desiguais, com pessoas, características, personalidades e crimes diferentes, de maneira igual. Então, o que nós pedimos é que seja feita uma análise caso a caso. Nós questionamos inclusive de que maneira seria feito isso, se existe uma real necessidade, se há estrutura para isso e entendemos que o Estado está admitindo que não consegue ter condição de gerenciar o sistema prisional, de executar o que a lei determina, provocando o Poder Judiciário e outros órgãos de Justiça para extinguir o regime (semiaberto) que a lei de execução prevê”, afirmou o Procurador-Geral.

O PGJ ainda demonstrou preocupação quanto à segurança da população, caso a medida se concretize. Ele destacou que há presos no regime semiaberto que estão dispostos a se reintegrarem à sociedade, mas nesse mesmo universo há muitos detentos perigosos que ainda pagam pelos graves crimes cometidos. “ Eles estão lá porque praticaram crimes de médio e grande potencial ofensivo, são estupradores, assaltantes, são pessoas que mereceram uma punição mais severa, tanto é que estão com uma pena a cumprir e que serão beneficiadas, convivendo livremente como se nada tivesse acontecido. Então, por mais que o poder judiciário tenha tido boa vontade ao enfrentar esse problema tão sensível, o qual assusta a todos nós, temos questionamentos a fazer e não concordamos com a forma que está sendo conduzido o problema”, alertou.

Durante a coletiva, o Ministério Público também questionou sobre a eficiência da estrutura que será necessária para monitorar todos os presos do atual regime semiaberto do Compaj. Informações do órgão ministerial atestam que hoje não há tornozeleiras eletrônicas suficientes para o monitoramento, o qual é feito por uma empresa de São Paulo que possui apenas uma equipe por plantão em Manaus, formada por 2 pessoas.

O Chefe do Ministério Público reiterou que o órgão vai recorrer da decisão judicial. “O Estado não pode acabar com o semiaberto para desafogar o presídio mandando os detentos para casa, pois isso é inaceitável. Nós entramos com duas manifestações imediatas, com embargos para que sejam elucidados alguns pontos da decisão e um agravo em execução, que é o recurso em primeiro grau, dando ao juiz a oportunidade de rever a decisão e, caso ele entenda que deva permanecer, remeta ao Tribunal de Justiça para análise. E, caso o Tribunal não contemple o pleito do Ministério Público, levaremos às instâncias superiores”, atestou Fábio Monteiro.

Problemas que a desativação do semiaberto pode causar de imediato:

– Condenado por estupro de vulnerável ou qualquer outro crime violento praticado no âmbito da própria família e que hoje está no regime semiaberto, deve voltar direto para a própria família;

– Apenado que deixou de comparecer para o cumprimento de sua pena no regime aberto e deveria regredir para o regime imediatamente mais gravoso, ou seja, o semiaberto. Com a nova medida, ele receberá tornozeleira eletrônica e continuará em casa.

Por que o MP-AM recorrerá da decisão judicial????

1. O regime prisional semiaberto está sendo convertido no uso da tornozeleira eletrônica, o qual não existe hoje condições de monitoramento;

2. Não há protocolo de fiscalização do cumprimento da pena com o uso da tornozeleira. A verificação das infrações por descumprimento do perímetro não é automática e as “justificativas” do apenado são avaliadas com subjetividade pelos agentes de monitoramento de São Paulo. Caso haja reincidência, pelos agentes de monitoramento (duas pessoas por plantão) em manaus, não há um padrão estabelecido para que o juízo seja informado sobre o descumprimento;

3. O MP entende que está havendo inversão das providências, pois o primeiro passo seria a triagem dos presos do semiaberto, verificação de suas condições pessoais, análise dos casos em que já tenham trabalho externo, para que, paulatinamente, esses pudessem estar fora do prédio onde é o regime semiaberto. Ao mesmo tempo, ao Estado cabe providenciar outro ambiente para que o regime semiaberto exista e nele possa ocorrer sua função legal, que é proporcionar a reintegração social por meio de capacitações para aqueles que têm mérito, melhor acompanhar e fiscalizar o trabalho externo e estudo;

4. O fechamento do semiaberto implica em dar a progressão por salto do regime fechado para o regime aberto porque, por mais que usem tornozeleira, a decisão menciona que os limites devem observar os locais de trabalho ou estudo. Ora, tais questões muitas vezes significam trânsito livre por toda a cidade. Ou seja, sem limites a serem aplicados, como se vai constatar se houve infração? Se o regime semiaberto já traz consequências nefastas, pois já houve registros em que o preso sai e volta, tendo praticado algum tipo de crime nesse meio tempo, muito mais vulnerável estará a sociedade com esse mesmo preso na rua, podendo comandandar de sua casa, de seu bairro, o crime, arregimentando gerações e subjugando a população ao seu entorno.

DEFENSORIA FAVORÁVEL

A Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM) acredita que o uso de tornozeleiras eletrônicas é a melhor forma para controlar os presos do regime semiaberto do Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), localizado na BR 174 (Manaus-Boa Vista). A instituição se manifestou publicamente nesta sexta-feira (16), encaminhando à imprensa seu posicionamento a respeito da decisão de juízes da Vara de Execução Penal (VEP), determinando a desativação da unidade do semiaberto da capital amazonense e o monitoramento dos presos desse regime por meio de tornozeleira eletrônica (leia mais aqui).

Em fevereiro de 2017, a DPE-AM recomendou a interdição daquela unidade para garantir o monitoramento dos presos, “que não vem ocorrendo”, conforme o defensor público Arthur Sant’Anna, que atua na Execução Penal em Manaus.

De acordo com Sant’Anna, em conjunto com a Defensoria Sem Fronteiras (DSF), que reúne representantes de todos os Estados e da União, a DPE-AM fez uma inspeção no semiaberto do Compaj e detectou que não havia as mínimas condições para aquela unidade existir, tanto na área física, quanto estrutural e por isso recomendou a sua interdição. “Não há qualquer controle de entrada e saída dos apenados, além de que a unidade do semiaberto é contígua à unidade onde funciona o regime fechado”, afirmou o defensor, citando, inclusive, existir nos autos documentos e fotos tiradas do local.

A decisão de usar as tornozeleiras é uma atitude corajosa e histórica, segundo o defensor, porque pela primeira vez o Judiciário reconhece a falta de efetividade do regime semiaberto, passando os apenados a serem verdadeiramente controlados pelo uso da tecnologia.

Para Sant’ Anna, o monitoramento é seguro e possível e há a recomendação para que a Seap se ajuste para manter esse controle e o Estado saiba onde estão os apenados. “Só quem não conhece o sistema atual, por estar fora dessa área, pode ser contra a desativação do semiaberto da forma como funciona no Amazonas”, afirmou ele, lembrando que a DPE-AM é a responsável pela assistência jurídica a mais de 80% dos apenados do sistema prisional amazonense.

O defensor garante que do jeito que está não pode continuar. “Os apenados precisam ser monitorados e o Estado deve ter tempo para construir uma unidade destinada a atender esse público em local diferente do atual”, finalizou.

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Este post tem um comentário

  1. Felipe

    Parece que estamos vivendo no fantástico mundo de bob, em nenhum País do mundo se libera presos sem analisar o caso individualmente. Parabéns ao PGJ que tem conhecimento sobre o assunto, que tomou a iniciativa de defender a sociedade.

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