Biógrafo de Calderaro deixa A Crítica após 24 anos e publica artigo no próprio jornal falando em caráter

O advogado Julio Antonio Lopes, um dos mais conceituados de Manaus, rompeu seu vínculo com a Rede Calderaro de Comunicação depois de 24 anos devotados à empresa, não apenas no setor jurídico, como também na preservação da memória do grupo. Foi ele quem escreveu a biografia do fundador do conglomerado, o empresário Umberto Calderaro Filho. No último domingo, já sabendo da possibilidade de ser desligado, ele publicou um artigo no jornal A Crítica dizendo que “ser alguém de bom caráter nos tempos atuais não é fácil, a porta está cada vez mais estreita”.

O texto está sendo interpretado como um desabafo do advogado diante da forma como foi tratado nos últimos tempos pela RCC. Em crise, o veículo tem atrasado salários de funcionários, o que o teria atingido também.

A saída de Lopes é um sintoma da mudança de perfil da empresa, causada pela crescente influência da nova geração nos rumos do grupo. O advogado foi admitido um ano antes da morte de Calderaro. Ajudou a filha deste, Cristina, a manter a empresa no prumo depois da partida do fundador. Assumiu a linha de frente em várias guerras comerciais e políticas travadas pela família.

Sempre ativo, Lopes disputou a eleição para o quinto constitucional da Ordem dos Advogados do Brasil, secção Amazonas, ficando em 14º lugar, entre 31 concorrentes, com 332 votos. Chegou a ter um depoimento gravado pelo jurista Bernardo Cabral, relator da Constituinte de 1988, recomendando o voto nele. Antes já havia disputado a eleição para a presidência da entidade representativa dos advogados.

O artigo que está sendo interpretado como um desabafo é o seguinte:

“Caráter custa caro

O nosso país, ninguém desconhece, vive a pior crise de sua história. Tirando as questões econômicas, sociais e políticas, parece-me que a origem do problema está de fato na formação, melhor dizendo, na deformação do caráter das pessoas, sobretudo daquelas que se encontram, na sua maioria, em posição de decidir, de ditar os rumos da nação, seja na esfera pública, seja na esfera privada.

Muita gente se preocupa com a educação formal, com cursos e mais cursos para adquirir a desejada competência técnica neste mercado ultracompetitivo em que estamos inseridos, mas se esquece de adquirir e de cultivar princípios morais. Sem isto, meus amigos, nada pode prosperar.

A crise, no fundo e no fim, é de confiança. Há escassez de pessoas em que se possa confiar.

Meu amado pai costumava dizer que, nos tempos dele, acontecia o inverso. Se alguém combinava com você alguma coisa, não era preciso nenhum documento escrito; bastava um fiapo de bigode para a promessa se concretizar. Faltar com a palavra, enganar, mentir, levar vantagem desonesta em qualquer espécie de negócio, quando flagradas, eram condutas que causavam grande reprovação social e vergonha, às vezes mortal, para o seu protagonista.

Hoje o pilantra ainda ostenta e se jacta!

O caráter, em termos simples, é aquele conjunto de virtudes e defeitos que determinam as ações humanas e acabam por marcar o sujeito como de boa ou má índole.

Vale a pena, porém, buscar o aperfeiçoamento pessoal e se inserir no mundo como um elemento de edificação.

Ser alguém de bom caráter nos tempos atuais não é fácil, a porta está cada vez mais estreita.

Acredito, contudo, que der vamos remar contra a corrente e fazer como ensinava o saudoso poeta português Sidônio Muralha: Parar, parar não paro. Esquecer, esquecer não esqueço. Se caráter custa caro, pago o preço.”

 

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