Antropoceno: Desafios da conservação da biodiversidade

Por Claudio Padua*

Não existe atualmente a menor dúvida de que a biodiversidade está desaparecendo em virtude da ação do ser humano. Aliás, toda a paisagem natural de nosso planeta está sendo modificada para dar lugar ao que os cientistas recentemente têm se referido como a era do Antropoceno.

Ao avançarmos nesse século, fica claro que o mundo está cada vez mais sendo afetado pelas ações humanas. O resultado é a urbanização crescente da superfície do planeta. E as consequências são graves sobre a diversidade da vida, que garante as condições necessárias à nossa existência. Assistimos a uma grande onda de crescimento populacional e de modificações planejadas e não planejadas das nossas paisagens. Na metade de nosso século, praticamente dois terços da população humana habitará as cidades. Algumas delas vão se tornar verdadeiras megalópoles que tendem a se juntar, como São Paulo e Rio de Janeiro.

No Antropoceno, o crescimento não escolhe onde vai acontecer, sendo impulsionado pelos mais diversos fatores sociais, ecológicos e econômicos. Todo esse processo certamente tem um forte impacto sobre as áreas onde atualmente residem os grandes bolsões de biodiversidade. Tais mudanças vão nos obrigar a tomar medidas sérias de reorganização do planejamento urbano e dos processos dinâmicos que compõem as cidades.

Precisaremos de estratégias para manter e trazer de volta para dentro das cidades a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos. Ambos são necessários para sustentar nosso futuro. Para tal, temos que incorporar na cidade de hoje muito do conhecimento que adquirimos nas zonas rurais. Temos que juntar isso com a ciência da conservação contemporânea e com os avanços que ocorrerão nos próximos anos. Princípios como biogeografia de ilhas, ecologia da paisagem, biologia da conservação e outros ramos da ciência que tratam do tema devem fazer parte do planejamento urbano.

Serão necessárias cada vez mais áreas protegidas urbanas no formato de polígonos e lineares, principalmente nas bordas dos rios. Quanto maiores essas áreas, melhor. Elas devem estar interligadas por ruas arborizadas e áreas verdes lineares, compondo corredores de fauna. Eles devem chegar até as áreas naturais da zona rural dos arredores da cidade. Tudo isso combinado com a proteção dos mananciais e bacias, com o devido respeito aos cursos d’água que as cortam. Enfim, precisamos de cidades que combinem o bem-estar humano com a conservação da biodiversidade. Ela depende da minimização dos fatores que levam a mudanças climáticas. Isso aumentará sua resiliência aos possíveis problemas resultantes da falta de planejamento urbano e do uso inapropriado do solo.

O livro “Biodivercidade: desafios e oportunidades na gestão de áreas protegidas urbanas”  de autoria das biólogas Angela Pellin e Erika Guimarães (publicado pela Editora Matrix em parceria com o IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas) apresenta uma abordagem bastante ampla sobre o tema áreas protegidas urbanas, com ênfase nas unidades de conservação das categorias parque e reserva biológica. Combina o conhecimento teórico das autoras com sua experiência resultante da realização de inúmeros planos de manejo de áreas protegidas em áreas rurais e urbanas. Traduz, também, um ponto importante na visão estratégica do IPÊ para os próximos anos.

O intuito dessa publicação é que possa ser utilizada não só pelo mundo acadêmico, mas também por profissionais de diversos campos que hoje não contam com publicações específicas que sirvam de referência para suas ações cotidianas. Discussões como essas são importantes para nos auxiliar na busca por cidades mais apropriadas à saúde e ao bem-estar de seus moradores, e que sejam ao mesmo tempo mais amistosas à diversidade da vida em nosso tempo e no futuro da humanidade, nessa era do Antropoceno que vivemos em nosso planeta Terra.

*O autor é Reitor da ESCAS – Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade, co-fundador e Vice-Presidente do IPÊ. Mestre em Estudos Latino-americanos e Doutor em Ecologia pela Universidade da Flórida (EUA). Professor aposentado da Universidade de Brasília. Pesquisador associado sênior do Centro de Estudos Ambientais e de Conservação da Columbia University e diretor internacional de conservação do Wildlife Trust Alliance, ambos em Nova York (EUA). Atualmente ocupa o cargo de conselheiro do Fundo Brasileiro para Biodiversidade – FunBIO e do WWF Brasil. Recebeu mais de 10 prêmios nacionais e internacionais, como “Empreendedor Social da América Latina” (2010) e “Empreendedor Social do Brasil” (2009).

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